Meu Vizinho Morreu..

18:45


A morte, para muitos, é uma coisa natural, e pensando bem, até que é mesmo, mas nunca sabemos como reagir diante de algo que contraria a nossa vontade. O meu vizinho morreu. Ele morreu, e não que eu o conhecesse, na verdade, não sabia o nome dele e creio que ele só falou comigo umas duas vezes, quando eu era criança e estava fazendo bagunça na sua calçada. Meu vizinho morreu e ele era um senhor como outro qualquer, adorava sentar na calçada no final da tarde e ficar sentindo aquele ventinho nos seus cabelos brancos, mas ele morreu.
Ele morreu, e não que isso tenha interferido algum coisa na minha vida, para falar a verdade, nada mudou, praticamente. Continuo sem saber seu nome.
Meu vizinho morreu e a ultima vez que eu o vi, mesmo de longe, foi no primeiro dia deste ano, quando ele entrava na ambulância, aparentemente bem debilitado. Meu vizinho morreu e minha vida não mudou em absolutamente nada, nem mesmo quando quatro dias depois da ultima vez que eu o vi, as 6h30 da manhã, ele estava sendo velado em sua casa. Lembro-me que parei o carro em frente a sua casa, pude ver meus outros vizinhos, seus familiares, netos e filhos. Um deles estava em pé, praticamente do meu lado, e chorava. Chorava como uma criança de 5 anos querendo um brinquedo novo quando não precisava, chorava muito e eu pude sentir a sua dor, naqueles 3 segundos em que eu parei em frente a sua casa enquanto esperava a oportunidade de continuar meu caminho, e enquanto ele estava ali, sofrendo a partida do seu pai. Meu dia não mudou, mas meu vizinho morreu.
Fiquei o dia todo pensando no quão frias podem ser as pessoas. Uma vida se fora, muitas outras continuavam, algumas não mudaram, como a minha, outras mudaram para sempre, como as deles, que ali estavam, naquele dia, as 6h30 da manhã. Tão cedo, tão triste.
Aquela frase de que a vida continua é bem cruel. Não que a gente tenha a obrigação de sofrer a dor das outras pessoas, mas naquele momento eu senti, e também me senti culpada por não sentir muito mais que isso e também por não poder fazer nada. Eu simplesmente não conhecia aquelas pessoas, aquelas pessoas não me conheciam, provavelmente também não sabiam o meu nome e assim tudo continuou.
Meu vizinho morreu. Nada mudou. Não que a vida dele seja tão banal ao ponto de não interferir em nada na minha, eu quero dizer é que a cada dia novas pessoas morrem e continuarão morrendo e isso só vai mudar a sua vida quando você estiver no lugar em que estava o filho do meu vizinho. Em pé, na calçada, chorando como uma criança a perda do seu pai.
A morte do meu vizinho me fez sentir como se eu fosse sozinha no mundo, como se ninguém importasse além de mim, como se um escudo me protegesse daquilo que eu não tenho a obrigação de sentir naquele momento, mas o escudo do filho do meu vizinho caiu, e ele foi atingindo tão fortemente que eu pude ver, em 3 segundos, o quanto doeu, e que naquele momento ele parecia tão vulnerável, e estava mesmo. Ele, provavelmente, perdeu tudo naquele dia. E o meu dia foi o mesmo. nada mudou. Para alguns, mais egoístas e egocêntricos, nada mudou mesmo, foi só o meu vizinho que morreu.

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